Lutos simbólicos de imigrantes e expatriados
- Bianca Madureira
- 24 de jan.
- 3 min de leitura
Atualizado: 30 de jul.

A experiência de imigração ou expatriação é, muitas vezes, associada à busca por oportunidades, segurança ou novos horizontes. No entanto, esse processo carrega consigo desafios emocionais profundos, entre os quais os chamados lutos simbólicos. Diferente do luto tradicional, associado à perda de uma pessoa querida, o luto simbólico refere-se à perda de aspectos intangíveis que fazem parte da identidade e do cotidiano de quem migra para outro país.
Esses lutos vão muito além da ruptura com vínculos afetivos que é o mais óbvio para quem vê de fora. Mesmo com as tecnologias que permitem manter contato, a ausência física de pessoas queridas gera um vazio que nem sempre pode ser preenchido. A perda de convivências cotidianas, de abraços e olhares transforma-se em um luto que exige resiliência emocional para ser processado.
Quais outros lutos são enfrentados?
1. A perda do lugar e da familiaridade
Uma das primeiras perdas percebidas é a do território conhecido. O lugar que antes representava segurança, pertencimento e memórias é substituído por um ambiente novo e muitas vezes desafiador. Dentro desse aspecto se contabilizam também as perdas de referencial: médicos, boas escolas para quem tem filhos e outras instituições que já tínhamos como referência no país de origem e que teremos que construir na nova morada. Ou mesmo, a ausência das ruas familiares, dos cheiros, sons, das paisagens e da antiga rotina pode gerar um sentimento de desorientação, como se o indivíduo tivesse perdido um pedaço de si mesmo.
2. O adeus à língua materna
A língua é um dos elementos mais importantes da identidade de um indivíduo. Quando se migra, muitas vezes é necessário adaptar-se a um novo idioma. Esse processo pode trazer frustrações, especialmente pela sensação de não conseguir se expressar com a mesma fluidez e profundidade que antes. A comunicação torna-se uma barreira que evidencia a saudade de quem somos em nosso idioma nativo.
3. O choque cultural e a perda de referências
A adaptação a um novo país envolve um encontro com costumes, valores e normas sociais diferentes. Esse choque cultural pode levar a sentimentos de inadequação e isolamento. Além disso, as tradições, festividades e rotinas do país de origem são perdidas ou adaptadas, gerando um luto pela vida que ficou para trás.
4. A perda da identidade social
No país de origem, o indivíduo possui uma posição social definida, baseada em sua história, profissão, status e relações. No novo ambiente, muitas dessas referências são desfeitas, e o imigrante ou expatriado precisa, em muitos casos, recomeçar do zero. A sensação de invisibilidade ou de ser apenas “um estrangeiro” pode ser um fator de dor emocional.
5. O luto pela ausência de pertencimento
Mesmo após anos vivendo em um novo país, muitos imigrantes enfrentam o desafio de sentir-se “em casa”. O pertencimento é uma construção que pode levar tempo, e durante o processo, é comum que surja uma sensação de estar entre dois mundos – não mais pertencendo totalmente ao país de origem, mas também não completamente integrado ao país de acolhimento.
6. O luto pela carreira
Para os acompanhantes dos expatriados isso pode ser mais latente. Pois, o seu companheiro escolheu crescer na carreira através da mudança internacional e a companheira (o) teve que abrir mão de sua carreira, muitas das vezes.
O luto de carreira enfrentado por expatriados e imigrantes é uma das perdas simbólicas mais profundas que acompanham o processo de mudança para outro país. A carreira está intimamente ligada à identidade, ao senso de realização e à autoestima, e, ao migrar, muitos indivíduos enfrentam desafios inesperados relacionados ao trabalho.
De toda a forma, migrar para outro país, seja por escolha própria ou por necessidade, implica muitas vezes deixar para trás uma trajetória profissional já consolidada. Esse "luto de carreira" pode se manifestar de diferentes formas, impactando tanto o lado emocional quanto o prático da vida de expatriados e imigrantes.
Entram nesse contexto a perda do status profissional, o rebaixamento de posição e salário, perda da rede de contatos, dificuldade da adaptação profissional e cultural e por fim, a perda de propósito e identidade profissional.
Apesar das dificuldades, os lutos simbólicos enfrentados pelos imigrantes e expatriados também trazem oportunidades de crescimento. A terapia pode ser uma ferramenta fundamental para reconhecer e elaborar essas perdas e assim abrir caminho para a construção de uma nova identidade, que combina elementos do passado com as descobertas do presente. Mais do que uma perda, migrar é um processo de transformação, onde despedidas e recomeços coexistem, permitindo que o indivíduo ressignifique sua jornada.

